quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Muita poesia e nenhum verso...

"O poeta e o leitor mantém, em nossos dias, uma atitude interrogativa, senão especulativa perante a poesia. E parece que esta atitude transcende a fria curiosidade do naturalista que se debruça para interrogar a analogia dos espécimes catalogados. É uma estranha decorrência das condições sociais em que vivemos. Se mimamos a poesia, se dela cuidamos com estranho amor, é para que não desapareça conosco, e para que represente, no futuro, o nosso testemunho."
Benedito Nunes (1929-2011)- Duas reflexões sobre poesia.


Minha poesia configurada no desenho.


Os versos não brotam entre os dedos que digitam ou que seguram um lápis...os versos surgem do mais íntimo ser no mais íntimo estante, não importa onde ele seja, não importa onde se esteja. A poesia é algo completo além de toda e qualquer compreensão humana perante os fatos corriqueiros humanos. Nela há um semblante de beleza e vida eterna, onde o tempo não passa, onde a beleza acompanha as sereias que murmuram cânticos eternamente para os viajantes perdidos no mar de Homero...

A poesia habita a Catedral de Notre Dame, acompanha o corcunda em sua crise existencial e seu sofrimento perante o preconceito de todos ao seu redor, a poesia encontra-se no amor por Esmeralda, ela firma-se na rejeição e transborda na loucura...

Com a poesia dei a volta ao mundo em 80 dias, como Capitão Nemo, refugiei-me do mundo na solidão do mar, longe de todos, mas perto de tudo...Mares, colossos, povos, enigmas, monstros...Vi a poesia concretizar-se em cada aventura pelo globo terrestre...

Com Emily Dickinson senti o mais profundo íntimo atroz de uma adolescente em seu conflito existencial e sexual... vi o amor brotar como brota a rosa em meio ao pedregulho...
Vejo a poesia no céu quando cúmulos e nimbos formas figuras animalescas metaforizadas em um céu azul que não passa de uma ilusão... Vejo a poesia nos olhos de quem não a vê, mas percebo o quanto ela tenta a todo custo mostrar sua voz que é oprimida pelo dia-a-dia... a poesia está nesses quadros que de tão belos me causam fulgor e delírios psicóticos, a poesia representada com a cor, a eternidade momentânea...

Quisera eu falar de poesia, mas me vejo meramente com um ser que passou por entre séculos, olho para trás e vejo meus primórdios, meus ancestrais... Vi guerras, sofrimentos, luxúrias, devaneios... Vejo então que a poesia não é para mim, sou a carne acoplada de um sistema nervoso, não bendigo dele, pois ele é farsante. As vezes sinto que a mais completa poesia é a mental, é aquela que você não sabe expressar, não sabe como a expressar, isso te deixa triste...furioso...deprimido...mas é ela!! Não somos dignos de descrevê-la...

Somos homens que ao passar dos séculos desenvolvemos diversos dialetos e diversas formas de escrita... O que mostrar se somos tão diferentes em um íntimo instintivo tão comum?

"Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço."
(Carlos Drummond de Andrade - Procura da Poesia)

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